Pais precisam mostrar que “agüentam o tranco”.
Deixar o infância provoca o maio estranhamento. Tanto para os filhos na relação consigo mesmos, quanto para os pais na relação com eles. Ao se depararem com mudanças tão grandes no humor, nos modos, nas reações muito diferentes que os filhos apresentam diante de situações tão costumeiras para a família, muitos pais se perguntam o que aconteceu com a educação que praticaram durante tanto tempo com a maior dedicação e paciência, com os laços afetivos que cultivaram com todo amor e carinho, com o respeito que o filho tinha até então pelos valores familiares.
Uma mãe, com filhos entre 11 e 14 anos, chegou a dizer, numa dessas horas de desespero, que achava que tinha perdido tempo com os filhos, pois ela não enxergava um traço sequer de tudo o que havia ensinado. Nenhum pai ou mãe perde tempo algum dedicado aos filhos.
O que acontece, então, nessa fase? Os tais hormônios explicam toda essa transformação? Claro que as mudanças hormonais precipitam todo esse processo e participam dele, mas não são as únicas e maiores responsáveis por essa mutação que deixa os filhos muitas vezes irreconhecíveis para os pais. Acontece que há muito mais coisa em jogo.
A primeira delas, mesmo que não reconhecida com clareza pelos filhos, é justamente a perda dos pais. “Ah, como é bom ser criança”, dizem muitos, inclusive os que não tiveram uma infância lá muito boa. Na verdade, se há algo de bom na infância é o fato de Ter sempre os pais por perto na hora do aperto, do risco, do machucado, da decisão, da escolha. Ainda que só em pensamento. E mesmo que seja apenas para funcionar como norte a ser combatido com todas as forças. Mas é uma referência forte, um porto seguro, mesmo que ilusório. Com a entrada na adolescência, o filho intui que está perto, muito perto de se transformar em seu próprio pai, em sua própria mãe. Esse é um bom motivo para esse humor e essa braveza, não é?
E isso é fácil? Sabemos que não é. Pena que grande parte dos pais que passam por essa fase de encarar o filho adolescente não se lembre de resgatar na memória as aflições muitas vezes disfarçadas, por que passou nesse mesmo período. Por isso quem tem filhos nessa fase, em que eles se tornam malcriados, respondões, revoltados, mal-humorados, bravos e contrariados com tantas coisas aparentemente sem importância alguma, precisa permanecer a postos: o processo educativo e de acompanhamento ainda não acabou. Está, apenas, mudando de etapa.
A mãe de um garoto que atravessa essa turbulência contou que já está cansada de dizer ao filho o quanto fica chateada ao vê-lo se comportar assim. Isso é tudo de que os filhos não precisam. O adolescente precisa, isso sim, perceber que os pais aguentam o tranco que ele está provocando. Mais do que amparo e segurança, isso é lição de vida que ele irá aprender na prática, o que vale bem mais do que muitos discursos. Isso não significa que os pais devem ser condescendentes com os excessos que os filhos cometem. Claro que não. Devem continuar contendo sempre que preciso as manifestações exageradas para que eles terminem de aprender a conter-se por conta própria. Isso também ajudo o jovem a perceber que sua intervenção e seus atos podem ofender e/ou magoar as outras pessoas. Isso é o mais importante: que eles saibam agir com respeito ao outro e de acordo com as regras de convivência social, e não para agradar ou desagradar ás pessoas.
Fica mais fácil suportar essa turbulência toda se os pais aceitarem como inevitável a separação que está ocorrendo. Caso contrário, vão tirar do filho aquilo que ele está prestes a conquistar: a independência , a liberdade para escolher e experimentar o tipo de vida que quer levar. E isso não se conquista sem esforço, sem equívocos, sem sofrimento. Não é?
e – mail: roselys @ uol.com.br. Extraído do jornal :Folha de São Paulo”, caderno Equilíbrio, 05/09/02.